Em jeito de balanço, volto a insistir em algo que disse na minha primeira intervenção neste tópico... a escolha do clássico faz a sua usabilidade, não há trajectos impossíveis. Desde que haja vontade, há uma solução.
Se olharmos para os carros actuais, temos quantas opções? Duzentas? Trezentas? Que na prática se reduzem a umas vinte ou trinta quando começamos a aplicar os nossos critérios e gostos individuais.
Se olharmos da mesma forma para tudo que foi produzido dos anos 60 para cá, quantos serão? Três mil? De certeza que no meio disto tudo há alguma coisa que sirva a toda a gente.
Muitos trajectos citadinos, com pára-arranca? Porque não um Mercedes de caixa automática? O espaço de estacionamento é pequeno e difícil de encontrar? Um Panda ou um Mini entram na boa. Estradas em mau estado? Nada que um francês não coma ao pequeno-almoço. Querem mais estilo? Um carro dos anos 60 é o ideal. Querem mais comodidades? Um carro dos anos 80 não deve nada a um actual nesse aspecto. E o que não tem, põe-se. Ainda ontem estive a ver
kits de
bluetooth para adaptar a rádios, pode-se arranjar sempre uma solução.
Eu continuo a manter a minha perspectiva... um carro moderno só ganha incomensuravelmente em segurança. Aí há que dar o braço a torcer. Mas eu não quero um carro para andar a fazer tabelas, e se vou comprar carro a pensar nisso também há clássicos da Volvo que prometem cuidar bem de nós num aperto. Mas eu prefiro acatar essa responsabilidade acrescida e ser um condutor mais consciente. Aliás, prefiro tudo o que tenho a liberdade de fazer num clássico em vez de ser decidida por mim num moderno. ABS? Tenho sensibilidade no pé. Direcção assistida? Sim, a minha é assistida a bifes (de seitan, faxavor!
). Nem servo-freio faço questão, gosto de ter mais
feedback do pedal. Vidros eléctricos? O ano passado troquei o elevador do vidro da porta do condutor da 124, era o de fábrica... e eu gosto de dar à manivela. Aliás, no moderno chateia-me ter de andar à lotaria para conseguir deixar a fisga que deixo quando está calor para o interior poder arejar, enquanto a manivela pára exactamente onde eu quero sempre à primeira.
Controle de tracção e de estabilidade? Já me dói a cabeça... eu sei conduzir! E se me apetecer dar uma gazada a saír de uma rotunda, tenho de gramar com a ama-seca electrónica que me dá um ralhete? Não, obrigado. Prefiro assumir a responsabilidade e ser infantil se me apetecer sem ter de me justificar.
Isto dava para estarmos aqui indefinidamente, mas uma coisa para mim é clara... detesto a "fiabilidade" dos modernos. Nunca sei quando vou ficar apeado. E quando fico (já fiquei), é algo que não consigo remediar. Enquanto nos clássicos sei que mesmo que haja alguma chatice, as que aparecem sem anunciar raramente são graves, porque graças a andar nisto desde miúdo sei ouvi-los e percebo quando se queixam, logo os males nunca chegam a sê-lo.
Aliás, a última vez que pedi um reboque para um carro meu foi há 15 anos... e foi simplesmente para não massacrar o carro, porque ele até teria chegado a casa a trabalhar a 3 cilindros (furou um pistão). Mas tinha outro carro de outra pessoa que ia em caravana comigo e seguimos viagem no clássico dele. Sem chatices, e ainda envergonhámos uns BMW novinhos na AE a caminho de Lisboa. Se tivessemos ido num TDI qualquer hoje já nem nos lembraríamos disso, assim é algo de que ainda nos podemos rir e lembrar com afecto.
Os clássicos tornam todas as viagens e trajectos em algo mais interessante do que simplesmente ir de A para B, passa a ser mais divertido. Fazemos amizades, temos histórias para contar, e temos algo que nos dá orgulho em ter e manter. Só isso já tem imenso valor e faz com que qualquer concorrência moderna fique logo posta de parte, pelo menos para mim.
E por mais que tente, não vejo nenhum ganho em usar um carro moderno. Não gosto de pagar 10 vezes o valor de uma revisão justa, nem peças inflaccionadas na mesma proporção ou mais ainda (já vi uma factura de um espelho retrovisor de um carro de gama média no valor de 930€ mais IVA! - e isto ainda sem estar pintado). E muito menos gostaria de estar a pagá-lo ao banco até depois de ele deixar de ser sustentável, coisa que num carro moderno é uma inevitabilidade. As maravilhas da tecnologia não me dizem nada, não quero internet no carro (nem o meu telemóvel deixo ligar, quanto mais o carro), não preciso que o rádio fale com o telefone, e muito menos quero um híbrido ou um eléctrico.
No final de contas acaba por ser também aquela opção de fugir da descartabilidade da sociedade de consumo, e para mim até mesmo o fugir de coisas que parecem oferecer muito mas no fim acho que tiram mais do que oferecem. Eu não me quero enquadrar num mundo onde as pessoas vão para uma esplanada para estar cada uma com o seu telefone pseudo-esperto em vez de conversarem. Onde cada vez há mais tecnologias para falarmos mas cada vez comunicamos menos, onde o culto do "eu" se sobrepõe aos valores de sociedade, onde a inteligência cada vez rareia mais apesar de acharmos que somos cada vez mais informados.
Desculpem o "testamento", já não volto a chatear... siga a dança!