Sexta-feira 13…
Na repassada Quinta-feira, quero dizer na quinta da semana passada, fui jantar com antigos colegas de trabalho e amigos de sempre ao Mugasa, em Fogueira, Sangalhos.
Como era um encontro de antigos colegas de trabalho e como todos nós somos já vintage achei que devia fazer a viagem em grande estilo, de Sunbeam, tanto mais que após os afagos que recebeu na Auto Escapes do Marco (não, juro que não me pagam a publicidade, mas merecem, gostam e tratam bem de clássicos) para ir à Inspecção parece que rejuvenesceu uns anos.
Há cerca de um mês fui a primeira vez aos encontros da Srª da Hora e a viagem, principalmente à ida pela marginal (Entre-os-Rios - Porto) foi um mimo que deu até para recordar algumas curvas com pequenas escorregadelas à moda antiga.
A viagem, cerca de 60 km.s correu tão bem que me senti encorajado a fazer 300 km.s para ir ter com os meus antigos colegas com o meu velho maquinão.
O senão era a luz. Os meus olhos estão um bocadinho mais frouxos que há 30 anos atrás e habituados a halogéneos e xénones.
Solução, pedir a um amigo que sabe ligar fios elétricos e isso para montar uns faroizitos de nevoeiro e assegurar uns 20 metros de iluminação ao nível da acuidade visual das lunetas do condutor. Havia que ter em conta as vicissitudes meteorológicas, principalmente na viagem de volta, sabe-se lá a que horas e com que níveis… de colesterol e de etanol.
Os níveis à partida estavam correctos, os do carro e os meus. Na volta asseguro que se mantinham dentro das margens de segurança, os do carro e os meus, enfim mais ou menos.
O jantar foi fantástico, além dos bolinhos de bacalhau, azeitonas e salpicãozito de entrada para acomodar uma ou duas minizitas, daí para frente foi sempre a dar gaz.
Tá-se a ver, amigos que já se não viam há bastante tempo, companheiros de longas jornadas de trabalho pela noite a dentro, só podiam fazer o que sabem, dar gás à língua, à garganta e a tudo daí para baixo.
As iscas estavam divinas, o réquinho que se seguiu além de assado tava bom como o carvalho e o tinto que o amigo JMC trouxe escorregava mais que óleo. O repasto desenferrujava melhor que W40. Cada vez carburávamos melhor, apesar de sermos só quatro tudo somado dava para aí 400 anos, nós e os nossos maquinões, clássicos de alta performance no seu melhor.
Mas havia que voltar, que o que é bom não dura sempre, convém guardar um pouco de energia para a próxima e além disso o dia seguinte era de labuta.
Mas para a volta estava ainda programada uma digestão como deve de ser, uma viagenzinha de 150 km.s pela noite adentro.
Arranco determinado, objectivo: hora e meia para cobrir os 150 km.s, sendo que apenas uns 30 seriam em estrada, no mais era sempre autoroute.
Os primeiro 50 km.s correram sobre rodas, pois ia de carro.
Em Antuã paragem técnica, o galope estava a deixar os cavalos com sede.
Depois de uma boas goladas aos cavalos, como velhos compagnons de route sabemos o que o outro está a sentir só pelo olhar, nada dissemos (eu e o Sunbeam), era para continuar o caminho, estávamos ambos bem.
Arranco, 1ª - 25, 2ª - 45, 3ª - 75, 4ª 100/120 km.s e a emoção recomeçou, a autoestrada é minha, não há chuva nem vento, o que mudaria radicalmente as sensações.
Após a saída de Estarreja passo a ter 3 faixas, quase, só para mim e lá vamos nós lançados no máximo, da velocidade legalmente permitida.
Mas, tenho um sobressalto, já passa da meia-noite é Sexta-feira 13…., depois lembrei-me que não sou supersticioso e fiquei mais tranquilo.
Em todo o caso… começo a sentir coisas, uma leve tremideira. Que raio, será transmissão, experimento baixar a velocidade e a tremideira mantem-se. Aumento a velocidade e rompo a limite legal e ups, vinha a navegar tranquilo numa das três faixas de rodagem mas parece que fui apanhado por uma big onda que faz do meu barquinho uma casca de noz, navego agora aos zigues e aos zagues nas três faixas da autoestrada e no limite vou à berma.
De um momento para o outro vi-me dentro de uma tempestade, era preciso manter sangue frio e mão firme, mas delicada, ao leme.
Corto o vapor e deixo-me ir na corrente. Aos poucos passei a navegar numa só faixa de rodagem e a ondulação vai acalmando embora não consiga ligar dois pontos pelo segmento de menor distância sem constantemente ir negociando derivas ao leme (fonix que complicação para dizer que era quase impossível seguir a direito).
Entretanto a tremideira passou a abanão com tudo a ranger.
80, 60, 40, 20, berma e… paramos. Ufa foi por pouco que não foram para o galheiro dois clássicos de uma vez, eu e o meu velho companheiro de estrada.
Safamo-nos desta, safámo-nos mais uma vez e ficamos cá para contar a história.
Procuro o colete, e venho certificar-me do que já sabia, o Viking M+S da traseira esquerda estava todo estraçalhado.
Agora que tínhamos conseguido sobreviver a esta borrasca era preciso não baixar as armas, ainda não estávamos a salvo e não queríamos morrer na praia, que raio queríamos escrever esta história atá ao fim.
Bora lá, mínimos acesos (ainda não aderimos à modernice dos piscas de emergência) triângulo (de que já só me lembrava dos fugazes encontros anuais de inspecção), chave de fendas para sacar o tampão e a arma de defesa que sempre levo comigo no Sunbeam para o que der e vier, a minha velha chave de rodas em cruz.
Das minhas costa à faixa de rodagem vai um bom metro e meio. A autoestrada tem três faixas. Quase não há trânsito, de quando em vez passa um camião que deixa uma rabanada de vento para trás. É uma recta com kilómetros e a Brisa ou a Brigada não deverão demorar a dar por mim. A noite está límpida e nem tão pouco está frio, ou então era eu que estava bem agasalhado com o colete refletor e a adrenalina.
Era muito azar morrer nestas circunstâncias a mudar uma roda mas todo o cuidado é pouco, afinal é Sexta-feira 13, não sou supersticioso nem acredito em bruxas, mas que las ai ai (ai ai sei lá se é assim que escrevem os hermanos).
Não fosse a circunstância de ter sido apertada por um bruta montes com um chave pneumática de porcas de camiões foi quase fácil sacar a roda.
O problema foi atinar com a sobressalente.
Luz só as dos camiões quando passavam e com a idade a pontaria já não é bem como era, chegou uma altura em que já duvidava que aquela roda fosse dali, com um perno atinava eu, o problema era atinar com todos ao mesmo tempo.
Mas depois de muita luta, esforço, suor e sem lágrimas, lá consegui apontar a jante e meter as porcas, benditas porcas quando as consegui começar a apertar.
Ora portanto… à pois, se for de 4 pernos aperta-se em cruz, se tiver mais é perno sim perno não, é pá já não me lembrava de mudar um pneu.
Pernos apertados, à que baixar o macaquinho devagar e ver o tamanho da barriga do pneu… hum, tem um bocadito de barriga mas é normal para a idade, sei lá quantos anos tem o pneu, penso que não é de origem.
Checklist ao material utilizado, tudo para dentro da mala, bora para dentro do carro, ignição, tirar colete, pôr o cinto e… finalmente vejo pirilampos azuis no retrovisor, tava a ver que os Géninhos da BT não iam chegar a tempo de me desejarem boa viagem e criarem condições de segurança para o take of (ou off, sei lá, quer dizer, arrancar e entrar na faixa de rodagem sem por sem perigo para o tráfego).
Porra os gaijos, logo dois, não pararam iam a bem mais de 200, eram descaracterizados e pela pressa que levavam deviam ir a proteger as costas a algum ladrã., perdão, figurão. Tá bem, não faz mal, afinal não há trânsito e tenho mais que tempo para arrancar em segurança.
Agora é só mais cerca de 100 km.s, sem áreas de serviço no caminho. Mas, se não me lembro da idade do sobressalente então é possível que seja mais velho e carcomido que o que rebentou… hum, o melhor é não passar dos 80, ir sempre a rodar o botão à procura de emissões no velhinho autorádio, é mais autoruído, pensar em coisas animadas, enfim matar o tempo e manter a pestana aberta, pois que isto de andar a 80 numa autoestrada à noite e sem movimento dá quase vontade de sair em andamento, fazer um xixi, tomar um cafezinho e voltar.
Por via das dúvidas desliguei a bem cheirosa chauffage (o francês soa-me sempre tão bem, fica-me tão bem) para diminuir o grau de conforto e aumentar o grau de vigília, afinal não queria dar uma de Marco Fortes (esta é só para olimpistas).
Depois nem hora e meia (a tal hora e meia a contar desde o início começou a contar outra vez) demorou a chegar a casa, entrar de mansinho, não acordar as ninas e esgueirar-me para dentro da cama. Eram 3, às 7 já cantava o galo.
Mais uma voltinha mais uma viagem, que hoje ainda é dia de trabalho, felizmente.
Prontos, isto é que é um diário de bordo, não é? Esforcei-me por usar termos náuticos e tudo.
Desculpem, com o nervoso esqueci-me de tirar as belas das fotografias para os amigos portalistas, fica prá próxima.
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