Carlos, de acordo novamente. Não existe vantagem na tracção atrás até determinado índice de potência. Na garagem mora um BMW E46 18i que era do meu pai (digo era porque a dada altura veio outro e com 15 mil kms decidiu-se deixá-lo ficar por cá, estando mais a meu cargo do que dele). Não existe vantagem nenhuma em ter uma arquitectura motriz teoricamente mais eficiente. O carro não descola de forma nenhuma com piso seco. Não tem motor para explorar o que podia ter de melhor, pese embora a forma como dialoga connosco de curva para curva represente uma forma mais táctil de pisar, típica de um carro que empurra e dificilmente se encontra num carro que puxe. Todavia neste caso, e carros que venham dali, até determinado período são feitos para ter 6 cilindros em linha (hoje a esmagadora maioria do portefólio é composto por 4 magros cilindros com apêndices de fôlego...). O facto de ter versões com 4 foi uma consequência da pobreza de espírito, de carteira ou de ambos.
Verdade que ficaremos sempre a pensar o que seria o V6 Busso a empurrar um 156. Era justamente aqui que seria superlativo por oposição ao que por limitação significa puxar 192 ou 250cv. Até lá a coisa funciona perfeitamente bem para o peso que transporta. Ainda assim, quando o mesmo concorrente puxava dos 6 cilindros que começava no 20i de 150cv, fico sempre a pensar o que não seriam os 155cv do 156 2 litros com a mesma arquitectura. Verdade que a realidade diz que o equilíbrio de forças ainda aqui penderia para o 156, no entanto como não é possível projectar um carro de forma estrutural em função da potência e do peso, dita a ciência que empurrar um carro preveligia sobretudo maiores potências eliminando as más consequências de motores maiores e de maior peso sobre eixos de tracção. De certa forma aquilo que o 156 teoricamente perde pelas limitações de ser tracção, compensa largamente pelo melhor tacto de direcção que conheço num carro actual que nos lê o piso até à ponta dos dedos.
Quanto a vendas o 156 vendeu cerca de 600 mil unidades entre berlina e sportwagon. Muito bom ainda assim. Vendeu muito e bem também entre muitos daqueles que não ligam nada a este mestiere. Mas ao não prostituir nada dos seus princípios, ou pelo menos trabalhando em cima daqueles que não sendo seus mais se lhe assemelhassem alcançou uma quota de mercado alargada dentro daquele que é o seu espectro. Por oposição ao 159 que alcançou uma quota de mercado muito mais estreita prostituindo muitos dos seus valores tentando jogar num tabuleiro que não é o seu, fazendo o mesmo jogo dos alemães, onde perde claramente.
Relativamente ao 911, para mim é uma declaração de princípios que começou pelas conclusões. Não encontro melhor definição que aquela que usou o Pedro Marques, a qual não tinha sido capaz de traduzir tão bem do sentimento à palavra e que subscrevo na íntegra.
"Infelizmente (...) falta-lhes ali qualquer coisa, ou um investimento humano, ou um traço mais feminino, subjectivamente falando falta-lhes arte, falta-lhes metafísica, falta-lhes intelecto, não sei… são carros excelentes em tudo, mas assemelham-se mais a robôs na perfeição, do que à perfeição humana. Será que são perfeitos demais para mim? Possivelmente são e isso… não é do meu agrado. Assim como disse anteriormente em relação aos filmes, gosto de histórias de vida de coisas reais, algo que me faça interagir humanamente e no Porsche, eu Pedro Marques não o consigo fazer, o carro não fala comigo, não interage, é apenas um excelente carro e eu gostava que fosse um excelente companheiro de viagem… quero na realidade muito mais do que a Porsche me oferece."
Não tenho rigorosamente nada a acrescentar a não ser rematando que se trata efectivamente de uma questão de filosofia, de perspectiva e conduta, de expectativa e correspondência, de princípio e consequência, de prosa e de verso, de gesto e de toque, de lógica humana e lógica cartesiana. O homem é monogâmico apenas por imposição cultural. Não é possível viver enamorado de uma silhueta tão pouco elegante e que ainda por cima delega o mesmo perfil ao longo de toda a descendência. É demasiadamente aborrecido, decadente, quase incestuoso, e de nada vale fazer tudo muito bem, se no final do dia não passa de uma contabilista tão eficiente que tira o máximo do nosso IRS.