FIAT 124 Special (Recuperação/Restauro)

(...)
Adorei a abordagem subtil à porca central da polie... Nota-se que já desmontaste muitos motores Fiat. :D

Sim, já lá vão uns quantos... e os primeiros foram lixados de tirar, por isso tratei de arranjar uma estratégia mais simples... o aperto daquela porca é o maior que alguma vez encontrei, nalguns casos ultrapassa as 200 lb.ft (os parafusos da cabeça são apertados a 58).

Bom ontem não consegui terminar o relato, a ver se é desta.

Separei as peças do cárter com mais cataplasma para serem desengorduradas, entre elas esta cobertura da distribuição...

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Notem que é perfeitamente visível o estrago causado pela folga da corrente... olhem as marcas.

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O bloco estava igualmente coberto de gosma nesta zona... ainda raspei alguma à mão com uma espátula antes de o lavar.

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No cárter ainda se vêem alguns restos da lixarada que foi ficando no fundo. Como o óleo levou o aditivo de limpeza, sempre deve ter removido uma quanta da porcaria que aqui foi sedimentando, mas havia muita...

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Entretanto, e olhando melhor para as camisas já depois de ter escorrido o óleo, nota-se que o motor tinha corrosão interna quando foi posto a trabalhar... indicando que deve ter tido um período de inactividade grande antes de ter sido reposto em actividade. Reparem que se nota a zona de corrosão não tocada pelo pistão, pois aquela zona corresponde às laterais que são abertas (estamos a ver a camisa pela parte de baixo do bloco), por isso não limpou a camisa. Esta poderá ter sido uma das causas dos segmentos partidos.

IMG_6002_zpscqz7fmx8.jpg

No tabuleiro por enquanto ficam algumas, que serão limpas de outras formas consoante os requisitos de cada uma, além de ter de se retirar aquelas que serão para substituir.

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Como o bloco vazio é relativamente leve, retirei-o a braços para um tabuleiro na rua, com a cabeça do suporte, para ser lavado, juntamente com alguns dos componentes mais sujos.

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Como se tinha acabado o Mistolin, fui comprar mais, e ainda trouxe mais um para experimentar, mas não serve para segurar uma velinha ao outro...

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Depois de uma tentativa com o Triclean, nem com o pincel a ajudar havia muitos resultados... vi-me e desejei-me para ver algum metal limpo. Desisti, apliquei o Mistolin e deixei actuar uns minutos. Agulheta para cima, e começaram logo a surgir outro nível de resultados...

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Vista geral...

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A bomba de óleo era a cliente mais difícil, mas mesmo assim lá foi largando a gosma... aqui ainda muito pouca.

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Depois de três rondas, a coisa já começava a ter um ar apresentável, deixei escorrer e pus a secar.

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Até mesmo a bomba já começava a ver-se...

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Entretanto comecei o levantamento dos estragos. Os bronzes estavam mesmo a dar de si...

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O panorama oscilava entre o mau e o terrível...

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Nos apoios da cambota não era muito melhor...

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Os que mesmo assim parecem ter-se safo melhor foram os de encosto...

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Depois de limpar, nota-se ali a marcação "000", que significa que ainda são da medida standard, não são de nenhuma medida de rectificação. Mesmo os restantes julgo serem todos ainda de origem, nenhum tem indicações de ter sido substituído, o que baterá certo com a quilometragem indicada.

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Entretanto retirei a última peça que faltava remover, que era a placa de fecho das galerias de água na traseira do bloco. Custou a saír, mas lá me fez o jeito, e revelou um bloco bastante são a nível de corrosão interna... havia muito poucos resíduos (vêem-se ali alguns no fundo, mas são poucos), e as galerias estão razoavelmente limpas.

IMG_6022_zpsvh6akkaz.jpg

A tampa em si também costuma sofrer bastante com a corrosão da zona interna, mas também esta se safou bastante bem... acho que é das melhores que já vi, costumam estar todas picadas. Nem tudo é mau...

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Outro elemento pequeno que faltava tirar era a torneira de drenagem do bloco, que neste caso estava inutilizada pois o manípulo já rodava em vazio em vez de actuar o mecanismo.

IMG_6025_zpswka2p1di.jpg

Esta torneira serve para retirar o líquido do circuito em caso de se pretender substituír sem desmontar muita coiisa. Uma vez que o fundo das galerias está abaixo do bocal da bomba de água, fica uma grande quantidade de líquido no interior se não for drenado por aqui. Podem ver onde ela fica, na lateral...

IMG_6026_zpsi5atc6uz.jpg

Entretanto também andei a raspar a tinta de esmalte aplicada em zonas indevidas (superfícies maquinadas não se devem pintar, bem como superfícies onde se vão assentar juntas, e havia aqui dos dois casos), além de remover alguns excessos em determinados sítios. Algum do esmalte saltou com a agulheta, por isso ou não é particularmente resistente ou foi mal preparado. Provavelmente vou dar-lhe uma limpeza quando regressar da rectificação e voltar a pintar.

Na frente, pode-se ver bem a diferença da limpeza...

IMG_6028_zpsjryr4qtu.jpg

Agora é medir cotas para comprovar o que temos. Amanhã dou conta dessa parte e do que encontrar, hoje não houve tempo de oficina.

Um abraço a todos!
 

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Eduardo, muito muito obrigado por toda a partilha. Ando a aprender imenso com este tópico. Mesmo sem quereres, acabas por continuar a ser um excelente professor, ainda que nos momentos de lazer.
Eu vou agora fazer o papel de aluno ignorante que, ainda assim, quer muito aprender. No entanto, colocando questões estúpidas e básicas (pois a minha actual literatura é o curso de hidráulica Citroën, com centenas de páginas, mas que me há-de deixar especialista em qualquer suspensão hidropneumática).

Eis as questões básicas: (1000 desculpas por tas colocar, mas só saberei a resposta se alguma vez perguntar. Sente-te à vontade para as ignorar, eu tenho consciência que é um abuso e um off-topic...)
1- Os bronzes são exactamente o quê? Capas que fazem o interior da fixação da biela à cambota? Ou seja, se eu bem percebo, a biela não aperta directamente na cambota, havendo umas capas (os tais bronzes) que servem de amortecedor às vibrações. É isso? Ou isto é um grande disparate?
2- Capas de biela e bronzes são sinónimos?
3- Os "apoios da cambota" são exactamente o quê? Iguais aos bronzes mas nas partes em que a cambota não está ligada a nenhuma biela, certo? Eles ficam fixos (e a cambota roda no seu interior) ou eles rodam com a cambota (havendo lubrificação entre eles e o bloco)?
4- O que são os "bronzes de encosto" ou "apoios de encosto" (não percebi bem...)? Estes nem sequer consigo conjecturar disparates...

Muito, muito obrigado!
 
Eduardo, muito muito obrigado por toda a partilha. Ando a aprender imenso com este tópico. Mesmo sem quereres, acabas por continuar a ser um excelente professor, ainda que nos momentos de lazer.
Eu vou agora fazer o papel de aluno ignorante que, ainda assim, quer muito aprender. No entanto, colocando questões estúpidas e básicas (pois a minha actual literatura é o curso de hidráulica Citroën, com centenas de páginas, mas que me há-de deixar especialista em qualquer suspensão hidropneumática).

Eis as questões básicas: (1000 desculpas por tas colocar, mas só saberei a resposta se alguma vez perguntar. Sente-te à vontade para as ignorar, eu tenho consciência que é um abuso e um off-topic...)
1- Os bronzes são exactamente o quê? Capas que fazem o interior da fixação da biela à cambota? Ou seja, se eu bem percebo, a biela não aperta directamente na cambota, havendo umas capas (os tais bronzes) que servem de amortecedor às vibrações. É isso? Ou isto é um grande disparate?
2- Capas de biela e bronzes são sinónimos?
3- Os "apoios da cambota" são exactamente o quê? Iguais aos bronzes mas nas partes em que a cambota não está ligada a nenhuma biela, certo? Eles ficam fixos (e a cambota roda no seu interior) ou eles rodam com a cambota (havendo lubrificação entre eles e o bloco)?
4- O que são os "bronzes de encosto" ou "apoios de encosto" (não percebi bem...)? Estes nem sequer consigo conjecturar disparates...

Muito, muito obrigado!


Meu caro:
Peço desculpa por este aparte, mas queria dar-lhe os parabéns pela coragem em fazer perguntas.
È fazendo perguntas que se aprende.

De certeza que o Eduardo Vai responder na integra.

Cump

Claudio

Claudio
 
Eduardo, muito muito obrigado por toda a partilha. Ando a aprender imenso com este tópico. Mesmo sem quereres, acabas por continuar a ser um excelente professor, ainda que nos momentos de lazer.
Eu vou agora fazer o papel de aluno ignorante que, ainda assim, quer muito aprender. No entanto, colocando questões estúpidas e básicas (pois a minha actual literatura é o curso de hidráulica Citroën, com centenas de páginas, mas que me há-de deixar especialista em qualquer suspensão hidropneumática).

Eis as questões básicas: (1000 desculpas por tas colocar, mas só saberei a resposta se alguma vez perguntar. Sente-te à vontade para as ignorar, eu tenho consciência que é um abuso e um off-topic...)
1- Os bronzes são exactamente o quê? Capas que fazem o interior da fixação da biela à cambota? Ou seja, se eu bem percebo, a biela não aperta directamente na cambota, havendo umas capas (os tais bronzes) que servem de amortecedor às vibrações. É isso? Ou isto é um grande disparate?
2- Capas de biela e bronzes são sinónimos?
3- Os "apoios da cambota" são exactamente o quê? Iguais aos bronzes mas nas partes em que a cambota não está ligada a nenhuma biela, certo? Eles ficam fixos (e a cambota roda no seu interior) ou eles rodam com a cambota (havendo lubrificação entre eles e o bloco)?
4- O que são os "bronzes de encosto" ou "apoios de encosto" (não percebi bem...)? Estes nem sequer consigo conjecturar disparates...

Muito, muito obrigado!

Afonso, não fazes mal nenhum em perguntar, e eu tenho o maior prazer em esclarecer... como a veia de professor ainda está cá mesmo que já não exerça, não me custa nada explicar... ;)

Então é assim... apoios da cambota são as traves internas do bloco onde esta é assente, bem como as metades de baixo, que aparafusam ao bloco. Estas podes vê-las nas fotos da lavagem junto ao bloco, o motor do 124 tem uma cambota de cinco apoios (pormenor raro nesta época, geralmente os motores de 4 cilindros só tinham 3 apoios, o que deixava a cambota flectir mais, com cinco apoios é mais rígido e melhor para a longevidade).

Os bronzes são aquelas cascas finas que ficam entre os apoios e a cambota propriamente dita. São rolamentos, basicamente, embora sem peças móveis. Têm uma base de aço e são revestidos a uma mistura de metais macios que amortecem as vibrações do movimento da cambota, sempre banhados em óleo que entre pelos furos a meio. São produzidos a uma tolerância muito fina para garantir que não há movimento indevido da cambota em uso.

As capas de biela são exactamente a mesma coisa, mas ficam dentro da extremidade maior das bielas e apertam nos braços da cambota.

Os bronzes de bancada ou apoio da cambota são fixos ao bloco (se reparares, têm uma ponta torcida para os localizar no bloco onde há uma ranhura a condizer), e as capas são fixas na biela. Rodam em torno dos pontos lisos da cambota.

Os bronzes de apoio regulam a folga da cambota em torno do seu eixo (ou seja, delimitam a tolerância finíssima que ela tem para se mover para cima e para baixo ou para os lados, basicamente é uma espessura micrométrica que serve apenas para criar o filme de óleo que a mantém a rodar com pouco atrito).

Os bronzes de encosto regulam a folga que é permitida à cambota oscilar para a frente ou para trás. É essencial que existam pois a cambota sofre esforços de todas as direcções. Os esforços axiais são essencialmente provocados pela acção da embraiagem, sempre que carregamos no pedal estamos a forçar a prensa a empurrar a cambota para a frente, e quando tiramos o pé a cambota recua. Se não houvesse um apoio permanentemente lubrificado para suportar este esforço, a cambota desgastaria os pontos de encosto no bloco e empenava as bielas.

Espero que tenha sido esclarecedor... o avançado da hora já me deixa ligeiramente incapacitado! :lol: Se ainda tiveres alguma dúvida, não hesites em colocar aqui, é sempre útil para mais alguém. Amanhã faço umas fotos de pormenor com estas coisas todas para pôr aqui.

Um abraço!
 
Muitíssimo esclarecedor! Acho que percebi tudo! Muito, muito obrigado!
Só uma última dúvida: os bronzes de encosto ficam exactamente onde? Na extremidade oposta ao volante do motor, depois do ultimo apoio da cambota?
 
Só uma última dúvida: os bronzes de encosto ficam exactamente onde? Na extremidade oposta ao volante do motor, depois do ultimo apoio da cambota?

Depende dos motores, tanto podem ficar numa ponta como a meio, mas quase sempre encostados a um apoio da cambota.

Geralmente são sempre assim.

brass_thrust_washer_bronze_thrust_washer.jpg

Mas pode em alguns casos ser com o formato de anilha, mas isso é mais em motores mais antigos ou por exemplo motores de compressores, geradores, etc.

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Obrigado, @Eduardo Relvas e @Rafael S Marques ! Estou absolutamente esclarecido e profundamente agradecido a ambos.

Eduardo: a veia de professor, quando se gosta, não se perde. Fica entranhada. Os grandes mestres ensinam facilmente, querem partilhar conhecimento e não mostrar que o têm. Não nos conhecemos, mas nota-se a léguas que a tua veia académica está bem presente pela clareza e simplicidade com que explicas tudo. Os meus sinceros parabéns. Agora acaba lá o doutoramento. ;)

(Agora que já sei mais alguma coisa sobre motores do que sabia ontem, vou ver se volto ao meu Curso de Hidráulica Citroën — versão para totós)
 
Obrigado, @Eduardo Relvas e @Rafael S Marques ! Estou absolutamente esclarecido e profundamente agradecido a ambos.

Eduardo: a veia de professor, quando se gosta, não se perde. Fica entranhada. Os grandes mestres ensinam facilmente, querem partilhar conhecimento e não mostrar que o têm. Não nos conhecemos, mas nota-se a léguas que a tua veia académica está bem presente pela clareza e simplicidade com que explicas tudo. Os meus sinceros parabéns. Agora acaba lá o doutoramento. ;)

(Agora que já sei mais alguma coisa sobre motores do que sabia ontem, vou ver se volto ao meu Curso de Hidráulica Citroën — versão para totós)

Sempre às ordens, caro amigo. E é preciso que haja quem questione para nós podermos esclarecer, por isso não tenhas problemas em perguntar, sempre que quiseres. Acrescento ainda que, no caso destes motores dos 124, os bronzes de encosto ficam no apoio traseiro, ou seja, o que está mais próximo do volante do motor (que é o lado de onde o bloco está fixo ao suporte de motores, se vires as fotos). Aliás, é onde faz sentido que estejam, pois é daquele lado que vêm as únicas solicitações axiais, logo não convém deixar a cambota carregar com elas para outro lado.

O doutoramento, infelizmente, com a alteração de ter cessado as minhas funções no Politécnico, ficou pendurado... como neste momento não sei o que vou fazer a seguir (embora tenha várias ideias, a maioria não tem ligação com a carreira docente), não estou apostado nele a 100%. Mas como não gosto de deixar coisas a meio, é provável que o venha a terminar, mas não é prioridade agora.

Um abraço e boas leituras!
 
Eduardo Relvas, peço desculpa pela intrusão... mas com tanto conhecimento e gosto pelos automoveis porque não fazer disso novo oficio?:thumbs up:
Boa sorte é o que desejo:)
Cumprimentos

Era justamente o que eu estava a pensar...

Já me passou pela cabeça várias vezes... mas além de morar numa zona em que dificilmente conseguiria tornar isso viável, ainda tenho um certo receio de tornar a paixão num trabalho. Ainda assim, algumas das ideias empresariais que tenho são orientadas para áreas nessa linha... nunca se sabe, neste momento ainda está tudo em aberto, não tenho pressa de tomar decisões, prefiro ponderar as coisas com calma.
 
Ora bem, vamos lá retomar o andamento... há uns dias que ando para vir aqui actualizar isto, mas como vão surgindo novidades em pequenos incrementos vou deixando passar.

Passámos à fase de inspecção mais detalhada, em que se procede à medição de todas as cotas críticas para aferir o desgaste do motor e quais as medidas que apresenta. A primeira coisa que medi foi a espessura de um dos bronzes da cambota...

101_1255_zpsksvujwxx.jpg

Seguido de um dos apoios da cambota propriamente ditos...

101_1256_zps6a1rbwa2.jpg

Depois de comprovar as medidas, verifiquei as medidas com a tabela de referência no manual de oficina para confirmar o que eu suspeitava... o motor ainda estava na cota standard (muitas vezes abreviada de STD).

101_1263_zpsymuv42w9.jpg

Medi todos os apoios da cambota e das bielas, e a cambota está toda ainda dentro das tolerâncias... safou-se.

101_1264_zpsw6nywrok.jpg

O diâmetro das camisas também ainda era o original... 80 mm.

101_1266_zpsgb6aocaq.jpg

A mesma coisa com os bronzes de encosto, tal como já tinha verificado...

101_1267_zpshd2jkgcf.jpg

Até aqui tudo bem, está tudo dentro das cotas, por isso a cambota vai safar-se com uma limpeza profunda e despolimento dos apoios para levar bronzes novos em cota standard.

As más notícias vieram a seguir... pus a árvore de cames na bancada, e comecei a comparar os lóbulos... é um problema que tenho visto várias vezes.

101_1269_zps8wult6jj.jpg

Usei um comparador simples, e tirei a medida por um deles, para depois comparar com os restantes. Atenção que convém comparar os de admissão entre si e os de escape a mesma coisa, porque podem ser diferentes entre eles.

Comparem este lóbulo....

101_1272_zpsmdvpbkme.jpg

... com este:

IMG_6032_zpsefr4liea.jpg

Este está comido de todo, tem perto de 2 mm de diferença dos outros. Há outros com desgaste, mas este é o pior. Não admira que o motor tivesse um trabalhar irregular... e de facto eu já tinha notado que havia válvulas que não abriam tanto quanto as outras. Mais uma vítima da má lubrificação...

Os danos ainda são mais notórios nos pistões... reparem que a camisa tinha 80 mm de diâmetro, vejam onde vai a espessura deles...

IMG_6034_zpsx2hp73fc.jpg

Dá para os baloiçar dentro da camisa... e meter uma folha de 0,50 mm entre o pistão e a parede.

IMG_6035_zpsq0hdcvsa.jpg

Dá perfeitamente para ver a folga...

IMG_6036_zpsmxrbtggt.jpg

As camisas vão ser rectificadas à primeira cota de rectificação (80,4 mm).

A seguir veio a bomba de óleo...

IMG_6037_zpsuvuzvvvi.jpg

Desapertam-se os 3 parafusos que a fecham, e acedemos ao interior...

IMG_6038_zpsxagqa8hq.jpg

Este é o andar de cima, onde tem a bomba propriamente dita. A parte de baixo tem o corpo do chupador e a válvula de alívio de pressão...

IMG_6039_zpsbbtvoeqo.jpg

Um dos danos comuns nestes motores é também a engrenagem que move a bomba, obtendo o movimento da engrenagem na árvore de cames. Com o esforço de rodar a bomba, e a pouca lubrificação que a engrenagem recebe, o estriado interno sofre um desgaste considerável, como podem ver... comparem o estriado mais dentro (zona onde move o veio do distribuidor) com a parte mais próxima (que move a bomba).

IMG_6041_zpsgzf34wha.jpg

Devia ser contínuo, mas nota-se que está comido e bem. Se se deixasse andar muito mais, acabava por desgastar por completo e ficava sem pressão de óleo.

Nota-se bem o desgaste na placa central... as engrenagens deixaram marca. Ou faltou óleo ou já estava queimado, e deixou-as morder a superfície...

IMG_6042_zpsbi3qrntr.jpg

Ainda se vê melhor depois de limpa...

IMG_6044_zpswh7hhjli.jpg

Vou falar com o meu torneiro a ver se ele consegue dar uma passagem de corte nisto, tirar-lhe um pouco para limpar as marcas.

As engrenagens também mostram marcas de desgaste irregular...

IMG_6046_zpsljdfjnmj.jpg

Apesar daquelas pequenas mazelas na superfície da engrenagem de cima, de resto a bomba está boa, não há folgas indevidas entre as engrenagens ou entre os dentes e o corpo da bomba, por isso tem safa. Vou ver com o torneiro também se é possível fazer o mesmo com o corpo da bomba e as engrenagens, para ficar tudo devidamente plano.

Com isto tudo, a lista de compras começou a tomar forma... jogo completo de juntas e retentores, pistões, bronzes, jogo de distribuição, árvore de cames... têm sido umas quantas horas a pesquisar entre todas as fontes habituais e mais algumas alternativas. A primeira coisa a pesquisar foram os pistões, que chegaram rapidamente de Itália...

IMG_6050_zpskilbwgum.jpg

Com estes já posso despachar o bloco para a rectificadora. Mas entretanto aproveitei e pesei-os a todos...

IMG_6051_zpseojdqbhx.jpg

Como sou picuínhas, gosto de equilibrar o que posso. Mas embora já tenha tido jogos de outras marcas com diferenças consideráveis, estes até estão bastante bem... tenho dois a 397 g, um a 398 e outro a 399.

IMG_6052_zps7aqxuhjx.jpg

Assim é fácil de equilibrar, não há muito a cortar. Seria perfeitamente satisfatório montá-los assim, mas quanto melhor equilibrarmos as massas móveis, mais suave é o motor, por isso vale a pena aproveitar e melhorar estes pormenores. As bielas irão passar o mesmo processo, assim que saque os pistões velhos... vou amanhã prensar os pinos para fora na prensa de um amigo.

Um abraço a todos!
 

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Já agora ainda partilho uma pequena curiosidade na qual tropecei há uns dias... em 1970 a Fiat decidiu fazer uma prova de demonstração da robustez dos 124 S, e fizeram o trajecto desde a Cidade do Cabo na África do Sul até Cape Nord. Não sei muito sobre a prova em si, mas encontrei estas fotos da reportagem...

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E esta é particularmente interessante, pois mostra todas as modificações que foram feitas aos carros para aguentarem as duras condições das estradas africanas...

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Se virem a imagem com atenção, tirando blindagem extra na frente, molas de taragem maior e um filtro de banho de óleo (tudo parte do equipamento de fábrica para zonas poeirentas), o resto são modificações simples para aumentar o conforto e segurança. Não houve modificações mecânicas. Têm uma bateria maior, faróis suplementares vários, uma roll-bar, o banco traseiro foi substituído por um painel com bolsas para organizar o material, há barras de reboque à frente e atrás, o painel de instrumentos é o do 125 S (mais completo, com conta-rotações), e o banco do condutor foi trocado por um mais anatómico. Ambos os bancos têm encostos de cabeça, há bolsas várias suplementares, um rádio, um porta-termos e reforços nos apoios do macaco laterais para melhor tolerar os abusos.

Vou tentar descobrir mais informações sobre esta prova, fiquei curioso para saber como terá corrido.
 

Anexos

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Mais uma aula brilhante, um post cheio de interesse. Fiquei mesmo impressionado com a engrenagem da bomba de óleo! Aquilo estava por pouco, ou pelo menos assim parece pela foto. Tem solução ou andas em busca de uma bomba nova?
 
Mais uma aula brilhante, um post cheio de interesse. Fiquei mesmo impressionado com a engrenagem da bomba de óleo! Aquilo estava por pouco, ou pelo menos assim parece pela foto. Tem solução ou andas em busca de uma bomba nova?

A engrenagem é uma peça pequena que se compra em separado com facilidade, é um mal conhecido destes motores quando são maltratados. O estriado do veio da bomba está bom, por isso é só trocar a engrenagem e está resolvido, já está uma nova a caminho.
 
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