De tudo o que aqui li, a opinião que melhor consigo subscrever é a do Rui Meireles. Os carros americanos (como quaisquer outros) têm de ser perspectivados e interpretados para a época e as circunstâncias em que foram concebidos.
É preciso ver que os muscle cars tiveram a sua génese nos anos 50 do século passado, a era dourada do apogeu americano. A década do baby-boom, do financiamento ao consumo e do aumento do poder de compra, do início da corrida aeroespacial e do crescimento da hegemonia norte-americana sobre o resto do globo.
Foi uma época em que os EUA se assumiram como donos e senhores do Mundo enquanto uma velha Europa ainda digeria os resquícios da guerra. Enquanto por cá se restringia, racionalizava e importava, por lá investia-se, comprava-se e exportava-se.
Com matéria-prima em abundância, combustível ao preço da água e milhões de quilómetros de estradas, pensou-se:
- “Porquê fazer pequeno e simples se posso fazer grande e estrondoso”?
- “Qual o sentido de instalar um motor de 4 cilindros com 40cv se posso lá montar um V8 com 300”?
- “O que me faria preocupar com a distribuição do peso e o centro de gravidade se tenho por cá retas do tamanho do Alentejo”?
- “Para que fazer um hatchback se posso desenhar um sedan com uma capacidade de mala na qual caiba lá dentro a minha sogra”?
É preciso ver que os americanos nunca conceberam os seus carros para outro mercado que não fosse o seu.
A GM, a Ford e a Chrysler nunca desenharam os seus carros ponderando de que modo iriam os mesmos circular ou estacionar na baixa pombalina ou mesmo acelerar pela serras de Sintra ou Arrábida.
Não. Estes carros foram criados para percorrer grandes quilómetros, tendencialmente em estradas largas, quase planas, e em velocidade cruzeiro.
Não era em rallies que se pensava, mas sim em Nascar.
Em suma, EUA e Europa são neste aspecto (como em tantos outros) realidades muito diferentes. É por isso que não me espanta constatar alguma desconfiança ou desprezo que os europeus têm para com os carros americanos. E acho que isso é bastante patente em Portugal, mercado no qual (contrariamente a alguns outros países europeus) os americanos quase não tiveram presença.
Quantos muscle cars foram comercializados ou mesmo importados para Portugal nos últimos 50 anos? Provavelmente contam-se em poucas dezenas.
É claro que gostos são gostos e não podemos gostar todos do mesmo, mas quando ouço críticas (não-fundamentadas, leia-se) aos carros americanos e aos muscle cars em particular, pergunto-me “Mas já teve algum?”, “Já conduziu ou andou à pendura num?”… melhor… “Já experimentou mais do que um?”
Eu já conduzi cerca de 5 carros americanos/muscle cars diferentes e até hoje nunca nenhum deles me deixou desapontado.
Bem sei que um Mustang não é um Porsche, um Camaro não é um Jaguar, e um Corvette não é um Ferrari. Não me vou por ao volante de um Plymouth Superbird na Serra da Estrela e a imaginar-me que estou sentado num Lancia Stratos a fazer contra-relógio nos Alpes franceses.
Como disse ao início, as coisas tem de ser entendidas no seu contexto.
Para mim os carros americanos e os muscle-cars em geral são fabulosos. Design fantástico, espaço mais que suficiente, equipamento fora de série para a época, motores com um binário e um som impressionante, etc.. E são estradistas fantásticos, pois até hoje apenas reconheço à Citroen a capacidade de os bater em conforto.
Enfim, compreendo tudo o que aqui foi dito e entendo como natural o maior apego sentido pelos carros europeus (muitos deles obras-primas da indústria automóvel).
Mas para mim, poucas coisas conseguirão exceder o gozo da ignição de um V8 e o sorriso rasgado de subir a Avenida Duarte Pacheco com uma quarta metida a fundo.
PS – e aqui quem já me conhece sabe que sou daqueles que opta sempre pela originalidade (os meus carros nunca se aproximarão a menos de 5 metros do Chip Foose).