Andre.Silva disse:
Brutal dedicação... Quando estiver pronto, depois de 10 anos parado vai levar uma lagrima ao canto do olho... É, sem dúvida, uma história feliz. Parabéns!
Infelizmente, vai muito além da dedicação, e lágrimas, já foram muitas...
Este carro foi comprado pela minha tia para o meu irmão quando ele tirou a carta. Assim que o carro chegou a casa o meu Pai fez rigorosamente o que tinha feito anos antes com o Citroen Visa que me tinha comprado, agarrou e revisão geral antes de começarem a andar.
Apesar do carro estar revisto, e em plenas condições de circulação, havia sempre qualquer defeito que o sacana tinha, ou era porque gastava (aparentemente um depósito de gasolina de Odivelas a Peniche), ou porque patinava por todos os lados, ou porque fazia ráters, em fim, havia sempre qualquer coisa.
O meu pai entretanto tinha comprado um Citroen ZX 1.4i para a minha mãe, e o meu irmão sempre que podia abarbatava-se a ele.
Eu como na altura só tinha mota (uma Virago 250s), de vez em quando dava-me jeito o carrito quando queria ir dar outro tipo de passeio ou para não andar sempre à chuva, via o Carocha parado à porta, mas aguentava-me à bronca porque o carro não era meu, ou pedia o Xantia ao meu pai e lá ia oou pedia o carro à minha mãe e estava tramado porque quem andava com ele era o meu irmão.
Entretanto o meu irmão arranjou casa marcou casamento e o os meus pais deram-lhe o ZX, o meu pai veio ter comigo e disse-me que uma vez que tinham oferecido um carro ao meu irmão, iriam fazer o mesmo comigo, ou teria direito a um carro na onda do ZX, ou... se quisesse ficava com o carocha na condição de ser restaurado, e adivinhem lá a minha expressão facial
Feita a troca de nome, passei a ser único, oficial e documentado feliz proprietário do carochinha...
Ainda andei com ele cerca de um ano com algumas mossas e painéis com jornais e fibra de vidro, até que se decidiu que era a altura certa...
Lá fui eu e o meu pai procurar algumas oficinas que fizessem um trabalho bem feito e ac€ssív€l...
Por indicação de um amigo meu fomos a uma oficina de um gajo que o meu amigo disse que era impecável, que tinha endireitado impecávelmente um Panda que esse meu amigo tinha capotado, e esse gajo aparentemente tinha ficado todo contente por ir mexer no carocha, e que ainda havia pouco tempo tinha arranjado outro, e disse que 3 meses eram o tempo necessário para a volta completa ao carro, chaparia, pintura, estofador e mecânica.
Demos a indicação ao senhor "oficineiro" que não tinha que comprar material nenhum, tudo o que ele precisasse fosse desde o capot à mais pequena anilha, só tinha que dizer o que queria e no dia a seguir senão no próprio dia tinha o que precisava...
No 2º dia que o carro lá esteve já estava todo desmontado, o trabalho de corte e remendo foi feito com relativa rapidez, mas a seguir começaram os problemas...
O sacana do carro parecia que tinha ficado ancorado na oficina, ou porque o bate chapas tinha comido ameixas quentes, ou porque as poeiras cósmicas e os extraterrestres tinham atacado tudo servia de desculpa, e uma vez que a oficina é na Póvoa de Santo Adrião e eu passava lá á porta todos os dias no meu percurso trabalho casa, não havia dia que eu não fosse lá...
Muitas peripécias se desenrolaram, mas fica para outra altura...
Um lindo dia quase um ano depois do carro ter entrado na dita oficina, o estofador que o aldrabão da oficina andava há que tempos (meses) a dizer que não conseguia falar com ele, ligou-me a dizer que tinha os bancos do carro feitos há 6 meses e que ainda estava á espera do carro fara forrar e estofar, queria saber como é que era, pois já tinha deixado de fazer trabalhos para ter a garagem desocupada para o meu VW...
Nesta altura o meu carro já estava pintado, e pouco mais faltava, mas andávamos há quase um ano a ouvi-lo dizer que tinha que arranjar outro estofador para fazer o trabalho, que aquele era um vigarista...
Saí do trabalho, e fui direitinho a Odivelas procurar o tal estofador, qundo lá cheguei ele mostrou-me os meus bancos, com um plástico em cima, já com um camadão de pó que pareciam ter estado nas pirâmides do Egipto
quase 4.000 anos, deu-me vontade de chorar, como podem ver nas fotografias, o trabalho do homem está perfeito.
O meu Pai passou-se com o paspalho da oficina e foi perguntar que raio de vida era a nossa, e o caramelo disse que queria dinheiro, dinheiro esse que era mais do que o que ele tinha merecido no trabalho feito, até porque já tinha levado bastante mais do que combinado, e acabou por ser o meu pai a assinar o cheque directamente ao estofador, e vim a saber que o meu carro foi pintado de borla, porque o gajo não pagou um centimo à oficina de pintura...
Tirámos de lá o carro á nossa conta e levámo-lo ao estofador que uma vez mais fez o maravilhoso trabalho que podem testemunhar nas fotos, depois disso foi para a garagem do meu irmão onde o meu pai conforme ia podendo
ia fazendo os acabamentos, como electricidade sistemas de travagem e coisas simples...
2007 o meu pai chama-me, e diz-me que tem algo para me dizer que vai mudar radicalmente a nossa forma de estar na vida.
Foi-lhe diagnosticado um Cancro no Pancreas, e entre outras coisas menos fúteis disse-me para eu pensar o que queria fazer com o carro, porque provavelmente ele não poderia fazer lá mais nada.
Ficou encostado às boxes, até porque se havia coisa que nem nos lembravamos era daquela coisa verde que estava na garagem.
Maio de 2009, o meu pai deixou de estar entre nós, e uma vez mais o bolinhas ficou de lado...
Entretanto cá em casa toda a gente me azucrinava a cabeça para vender o carro, mas como devem imaginar, a carga simbólica sempre me levou a dize que o carro ia morrer comigo...
Um amigo meu que tem uma oficina quando viu como o carro estava disse-me para o meter no reboque e o levar para a oficina dele que aos poucos a custo zero, ele me acabava o carro, e assim fiz.
O rodinhas chegou á venda nova numa manhã de Verão, e 2o minutos depois de ter sido descarregado do reboque o motor roncava à 3ª volta do motor de arranque...
Ainda cheguei a dar umas voltinhas à Venda Nova, para afinar travões e afins, mas o motor trancou...
Depois de desmontado, descobrimos lá dentro silicone de juntas com 30 anos a entupir o filtro da bomba de óleo e peças que durante esse tempo nunca devem ter visto lubrificação, foi então que em Novembro metemos tudo em caixotes e levámos à Veicomer para refazer a obra de arte que está nas fotos, vem prontinho a dar á chave e andar, com dois anos de garantia...
agora é questão de dias...
O trabalho do meu pai não foi em vão, e o carocha na estrada é mais que uma homenagem áquele que sempre me ajudou e nunca me faltou com nada...É por isso que eu digo que vai ser bem mais que uma lágrima no olho...