Tintas & Afins, Sociedade Anónima

Luis C Matos

Clássico
Boas Pessoal,
Estava noutro dia eu no FB quando recebi um comum pedido de informações de um indivíduo que gostava de saber como é que se pintam os carros pertencentes às equipas de presidentes, ministros, reis e condes e que apresenta uma pintura lustrosa de alta qualidade e cujo brilho ofusca qualquer outra.
Lá tive que explicar algumas coisas sem revelar o segredo da arte, porque há trabalhos que se fazem em viaturas que não podem ser aplicados em outras de comum uso, não porque eu e outros colegas da arte não se vejam na impossibilidade de as fazer em cima de qualquer classe de viatura mas sim, pois, porque este estilo de pintura requer não só elevado preço de produtos e não das tintas.
Mas aqui vou explicar algumas coisas que são desconhecidas de quem aplicada tintas e que raramente é mencionado. Logicamente não nomeio a química usada ou dou referência e preferência a qualquer produto ou marca usados por mim.
A compatibilidade de cada produto no sistema de tinta é muito importante seja em relação à superfície sobre a qual vai ser aplicada ou entre os diferentes produtos utilizados no sistema e existem muitos outros componentes que não foram concebidos como sendo parte única de pintura que sendo mal aplicados resultam em efeitos adversos para o fluxo de cores e a superfície pintada por essa específica combinação de vários produtos.
Eu mesmo só consegui formular uma combinação exacta ao fim de 400 horas a usar um bem apetrechado laboratório e depois debaixo da vigilância de um bom mestre com 37 anos de experiência que só revelava os segredos da arte a um único aluno de cada vez e à porta fechada sem que os restantes soubessem o que se tinha revelado ao colega da equipa e sem que ninguém pudesse tirar apontamentos escritos, sendo esta aprendizagem depois passada individualmente ao sigilo total e cada um somente dentro do seu próprio saber de química e conhecimento profundo das formulações exactas obtinha um resultado único como uma impressão digital que nem os fabricantes de tintas podem igualar já que desconhecem as quantidades, formulas e que produtos afinal é foram aplicados individualmente uma vez que a variedade de produtos é imensa e com infinidades de prováveis combinações que tem que ser exactas e de acordo com o que cada pintor sabe e é idêntica a uma combinação de um cofre com milhares de prováveis chaves.
Há muitos factores a serem considerados antes da mudança da cor total de um veículo e é um processo mais difícil em alguns veículos do que noutros porque depende de factores dos componentes e das matérias com que foram feitos e cada fabricante de carros não é de modo algum idêntico a obedecer a um protocolo que seja reconhecido por outra marca da sua concorrência.
Nem todos os carros e as suas cores resultam num bom jogo de estética final e as montadoras gastam uma fortuna em marketing e muita pesquisa laboratorial para chegar a uma faixa de cores e formulações específicas em cada modelo e isso está resumido às preferências de cada fabricante de carros e por isso não se aplicam tintas nem formulações usadas num Rolls Royce Phantom ou de um Bentley Continental num antigo Mini ou num Volvo 122 por exemplo.
Um dos métodos utilizados para determinar a formula de pintura em qualquer veículo é através do uso de um espectrómetro de cor que é uma ferramenta de elevado preço e que na maioria dos casos não é encontrada nos fornecedores de tintas e aqui cada fabricante acaba a garantir que outro concorrente não vai conseguir, pois, encontrar a combinação exacta de cores utilizando os simples códigos de tinta com o espectrómetro ligado a um PC equipado com programas específicos e quanto muito só podem “imitar” através da afinação de cores ou então repintar a viatura inteira com nova formula.
Um dos grandes problemas que eu encontrei foi determinar o método de aplicação e leitura do espectrómetro para determinar as fórmulas que se chamam "tri-estágio" onde pretendi revelar acabamentos que tem aditivos especiais tais como pérolas ou metálicos e outros aditivos químicos que por si só compõem aquela cor especial. Mas o espectrómetro não é exacto na sua leitura e impõe um certo conhecimento de uma gama variada de muitos outros produtos e de química.
A realidade é que quando se trata de carros com uma certa pintura de alta qualidade e trabalho envolvido não há um limite real quando se trata de saber de antemão o orçamento.
Daqui resulta que é possível adquirir tintas já pré-formuladas mas o seu preço é muito mais elevado e mesmo assim bastará um simples grama ou gota a mais ou a menos deste ou daquele produto para que o resultado final seja um desastre total e muito distante da qualidade pretendida.
O grande problema não envolve somente a aplicação de tintas porque na realidade eu obedeço a uma ética onde tenho que ter em muito boa conta que há produtos que tem que ser aplicados sob as temperaturas de 70 graus e menos de 40% de humidade tal qual como são condições exigidas em laboratório para a criação destes produtos e no meu caso há formulações desconhecidas do vendedor de produtos de pintura automotiva em que há etiquetas individuais e nomeadas para o efeito de ocultar o seu verdadeiro conteúdo em retardadores e redutores específicos que incluem um certo intervalo de tempo de cura dos próprios produtos misturados propositadamente para idealizar uma alta performance e oferecer uma alta durabilidade e nisto um pintor inexperiente já não tem senão que aplicar comuns camadas de tintas e vernizes que só irão imitar o que pensou ou viu ser aplicados mas que desconhece outros passos que não estão à vista de qualquer um.
O que sucede numa pintura de certos carros que originou este texto, através da curiosidade do indivíduo que me questionou, é que por vezes há aplicação de sobre camadas umas em cima das outras aliadas a uma química própria e isto na valorização de um antigo automóvel vai transparecer diante de experientes observadores tais como sucede com os que obtêm o devido certificado de conformidade para ser considerado clássico que por sua vez tem que obedecer a um rigoroso protocolo.
Por outro lado não se pense, tal como os raros observadores tiveram ocasião de me ver fazer ao vivo e a quem eu cedi à sua presença na estufa para verem pintar o seu belo bólide, que eu aplico uma demão de tinta e depois outra e mais outra e que entre cada nova camada eu não tenha já preparado de antemão cada camada acrescida de secretas formulas para adequadamente aderir à seguinte e quem já tentou encaixar simplesmente camadas de tinta e de vernizes umas em cima das outras já teve grandes e desagradáveis surpresas finais.
Num antigo estágio e já com outro mestre com os seus 32 anos de longa experiência e que só muito mais tarde descobri o segredo de que ele foi amigo desde a infância do meu primeiro mestre de formação, houve um Jaguar que levou 3 camadas de tinta e 3 de verniz, mas este mestre usava tal como, eu uso, os seus próprios frascos numerados individualmente e ainda por cima com etiquetas coloridas resumidas no mais simples a 2 números e uma letra final sem revelar alguma vez o seu conteúdo tal como eu nunca revelei as minhas fórmulas e é justo que assim seja.
Para terminar, o polimento e acabamento final tem ainda uma outra arte de produtos a ser aplicados que vão “selar” a pintura toda de modo a garantir que entre cada polimento do seu proprietário, e desconhecendo eu quais polidores de seu uso, não haja desgaste da pintura. O que podem ver no meu posto de trabalho é simples embalagens cujo rótulo nomeia só “Polidor” e “Selante” tendo as embalagens originais sido destruídas a fim de ocultar a marca ao mais atento observador e já o mestre tinha uma mania de despejar uma secreta mistura de 3 componentes dentro de embalagens de uso comercial e corrente que iludiam bem quem o observasse.

Como dizia Albert Einstein: “O segredo da criatividade é saber esconder as fontes”.
 

Mário Pio

Detailer
Interessante artigo e pensamento mas o meu ponto de vista e diferente quanto a "ocultação" do verdadeiro produto...quem é artista procura, faz o teste e tira o sua propria conclusão happy.png , o facto de eu me adaptar a um determinado porduto não quer dizer que outra pessoa tenha o mesmo resultado, porque todos nós somos diferentes no metodo de trabalho e o segredo está na implementação e não só nos produtos que se utilizam. Tudo a ideia restante está sem duvida interessante e correcta....
 

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