Capítulo XIV
Hoje foi dia de passeio. Aproveitei o bom tempo, que não dura sempre, e a folga, que é sempre curta, e agarrei no Elefante Branco para ir visitar a serra. Há pouco tempo que o Sr Dr lhe tinha dado alta, depois do último achaque, e agora, com casquilhos de direcção novos e as trancas das portas operacionais, enchi-me de coragem e fiz-me à estrada. Não contei os km, mas foram alguns, metade a subir, outros tantos a descer. Não avariou, nem aqueceu, nem se queixou. Eu também não. Enfim, aqueci um bocadinho, tive que ir parando aqui e ali para beber uma mini, mas como tinha o dia por minha conta, não foi grave.
Escolhi um caminho pouco movimentado, campestre e rural, com um piso original: embora com poucos buracos, é tão deformado que mais parece que vou de barco. Se a polícia andar por ali, pedem-me a carta de patrão de costa... Contudo, o elefante é um espectáculo: oscila um bocadinho, mas nada de safanões bruscos nem pancadas nos batentes, como às vezes acontece com outros carros. Mérito da tecnologia dos anos 60, das jantes de 13 ou dos sofás de espuma? Não sei, nem me importa. Vinha-se tão bem ao solinho e a balançar, que tive que parar para beber uma mini. Aproveitei para tirar uma foto.
Ver anexo 1059310
Olhando para ela, parece-se muito com as outras fotos que já tenho. Se calhar é por ser o mesmo carro.
Enfim, já um bocadinho mais consolado, voltei à estrada, que entretanto melhorara bastante, e fui andando devagarinho enquanto observava a paisagem. Um verdadeiro condutor de domingo à sexta-feira. Que acto de rebeldia! Mas achei que era o que o carro merecia, que era o seu estilo, e ainda por cima, era assim eu o meu avô fazia. Acho que começo a perceber porquê. Soube-me bem. Soube-me tão bem que parei para beber outra mini e tirar outra foto.
Ver anexo 1059311
Até aqui já me tinha cruzado com três carros e outros tantos ciclistas. Não ultrapassara ninguém, nem ninguém me ultrapassara. King of the Road, mas daqui para a frente, começava a subida e estava algo apreensivo acerca da mecânica do bicho. Tinha medo que aquecesse. Para evitar isso, ponderei beber outra mini, mas enchi-me de coragem e fé no trabalho do Sr. Dr. e fui adiante, que para a frente é que é Lisboa. Fui adiante, mas devagarinho, e com um olho no ponteiro da temperatura e outro no da gasolina, não fosse o diabo tecê-las. E outro olho na estrada que tinha curvas, e outro na paisagem que era interessante, toda queimada dos incêndios do último verão. São muitos olhos... Uns quilómetros mais adiante, parei outra vez, com a intenção de beber uma mini e tirar uma fotografia, mas como não havia sítio que vendesse minis, tirei 2 fotografias (eu sei que o pessoal gosta é de fotografias)
Ver anexo 1059320
Achei graça ao sinal chamuscado, embora me pareça que com tanta sinalização imbecil que há por aí, seja uma pena queimar logo um sinal que dá permissão para ultrapassar. Já são tão poucos...
Ver anexo 1059314
É desolador ver a serra assim, tenho muita pena dos eucaliptos, mas confesso que lhe acho também um certo encanto. É diferente.
Aproveitei para tirar uma foto à estrada. Fez-me lembrar os fulanos do Top Gear, que são capazes de atravessar meio mundo com um Ferrari e um Aston Martin para descer uma estrada de montanha e chamar-lhe a melhor do planeta. Se algum deles vier ler o meu diário de bordo há de roer-se de inveja.
Ver anexo 1059315
Acredito que se tivesse um Ferrari ou um Aston Martin a estrada me teria parecido melhor ainda, mas de Cortina também não se fez nada mal.
Por esta altura é de realçar o facto de que da parte do veículo, não houve nem um queixume. E nem a temperatura subiu, nem a gasolina se gastou. Enfim, gastou alguma, mas ainda chegou para completar o passeio.
Mas o passeio não acabou aqui. Continuei a subir, com tranquilidade, com muita tranquilidade, até parar para almoçar. Com um tempo tão bom e um solzinho tão agradável, adivinhem o que bebi?
Água, porque ia conduzir, e é o indicado para acompanhar o pernil no forno.
E pronto, depois do almoço é sempre a descer, a caminho do fim do dia. Também é verdade que almoços destes não são para ser apressados, nem eu tinha para onde ir, a não ser para baixo, e para baixo todos os santos ajudam e a temperatura não sobe tanto. Nem se gasta tanta gasolina. Tudo vantagens. Senti-me tão bem que parei para tirar outra fotografia.
Ver anexo 1059316
Garanto que não tinha reparado na garrafa. Não sei quem a terá posto ali à frente do carro...
E basicamente foi isto, o primeiro teste está feito. Não foi uma road trip nem sequer uma viagem, mas foi um passeio agradável e sem incidentes. O Elefante portou-se admiravelmente bem, como aliás era sua obrigação, depois de todo o dinheiro que gastei nele, e deu-me alguma confiança para me aventurar num percurso mais longo. Talvez ao Tibete. Ou talvez a outro sítio porque não sei se no Tibete vendem minis.
Se tudo continuar a correr bem, qualquer dia meto-lhe gasolina.