Pedro Moura
YoungTimer
Este é um texto meu, publicado na TOPOS& CLÁSSICOS DE DEZEMBRO de 2015 por gentileza do Hugo Reis, e que copio aqui quase na íntegra.
"Há precisamente dez anos, ali a seguir às férias de verão, tomei uma decisão que ora apelido da decisão mais absurda da minha vida, ora encaro como um dos projectos que mais prazer me tem dado ao longo destes intermináveis dez anos. E dos que ainda faltam, seguramente muito menos do que dez!
Na altura comecei por desmontar as duas portas da frente do meu DSuper de 1970 para tratar apenas uma "meia dúzia de podrezitos" nas embaladeiras mas dava mais jeito se desmontasse também os guarda lamas da frente... e assim foi.
Depois, como que num "já agora", segui para as portas de trás e mais tarde, inspeccionada cuidadosamente a tampa da mala, verifiquei que esta também não tinha escapado à acumulação de água na zona da borracha de vedação. É muito normal nestes carros.
Finalmente, como o capôt já estava fora, só faltava mesmo o tejadilho e assim fiquei a saber como fica engraçado um DS sem os painéis da carroçaria...
E que teríamos nós debaixo dos tapetes!? Estava com muito medo de os levantar mas tinha que ser... Ó meus Deus, quase não tinha chão do meu lado!!... A sorte é que a fuga de óleo do repartidor dos travões estava a retardar o avanço da corrosão. Tinha mesmo que tirar os bancos; e o depósito da gasolina; e o tablier. E tinha de desmontar as portas para as tratar por dentro; e tinha de substituir grande parte da alcatifa insonorizante que estava podre e a esfarelar.
Os trens da suspensão de trás, pintados no verde característico do circuitos de óleo LHM estavam mesmo feios. E as barras e crenques de direcção então nem falar... o motor e a zona do charriott estavam tão feios e sujos de óleo empapado com terra, que o motor tinha inevitavelmente que sair...E foi assim que cheguei ao natal de 2005 com o DS todo desmontado.
Fosse o DS um carro convencional e, mesmo no meu ritmo de entusiasta que evita dar o trabalho a terceiros, o carro já estaria a rolar há mais de cinco anos (como aliás foi acontecendo com outros projectos intercalados com o DS pelo meio destes 10 últimos anos). Mas um DS é um "projecto de vida" como eu costumo dizer aos meus amigos e familiares: neste carro nada é convencional; nada é normal; nada é igual a nada, a começar pela medida e passo dos parafusos M5, M7 e M9... para não referir o óbvio que é a suspensão hidro-pneumática.
A verdade é que a chapa revelou estar bastante pior do que eu algum dia podia ter imaginado e até que o chapeiro pusesse o chassis pronto a pintar demorou mais de dois anos. Tudo feito no meu armazém/oficina e nas horas vagas do chapeiro.
O tratamento dos componentes hidráulicos como a direcção assistida, o acumulador, os correctores de altura e repartidores, isto é, a sua desmontagem, limpeza, compra dos respectivos kits de reparação, pintura e remontagem, ficou a meu cargo e demorou o seu tempo.
Cedo decidi que o motor nunca iria voltar para o sítio nas condições em que estava e também ele foi desmontado até ao último parafuso. E ainda bem porque embora os pistões estivessem muito bons, os segmentos precisavam de ser substituídos. Aproveitei para limpar o bloco por dentro e por fora, para o pintar, para polir todos os componentes não ferrosos, pintar todos os acessórios externos como o depósito de óleo LHM, filtro de ar, bobina e uma panóplia de chapas de suporte que mais parece terem sido feitas na fase de produção do protótipo porque os engenheiros se tinham esquecido de como iam segurar aqueles componentes ao motor!
Pelo caminho fui recorrendo à ajuda de amigos especialistas onde o trabalho se mostrava mais complicado como a reparação da direcção assistida, o armar do bloco do motor e para rodar e afinar válvulas depois de revista a cabeça.
Este ano o carro foi finalmente para o chão com o motor a trabalhar e com todo o sistema hidráulico revisto e em perfeitas condições! Uma vitória e um marco no projecto. Atrevo-me a dizer que quem restaura um DS fica apto para qualquer carro (só o SM deve ser mais complicado uma vez que leva um motor italiano...)
O DS está agora preso à espera dos perfis de suporte das borrachas de vedação das portas e depois de montar os painéis e de afinar todas as folgas, vai pintar, algo que não serei eu a fazer porque quero uma pintura imaculada na sua cor de origem que é o Vert Charmille (AC522) com tejadilho Gris Nacree.
Tenho dado por mim a pensar que o que me dá o verdadeiro gozo é o meio e não o fim, ou seja, depois de um carro pronto, é verdade que o prazer de o desfrutar é grande, mas para mim nada se compara ao gozo de vencer a batalha contra um parafuso partido num furo onde aperta a bomba de água, ou de chegar ao fim da instalação eléctrica com os fios todos ligados no sítio certo.
Ao meu ritmo de trabalhador por conta de outrem, estimo que entre pintura e estofador, o meu DS fique pronto lá para o verão de 2017 mas já estou com medo que a primeira saída não me dê o prazer que me estão a dar estes dez anos de restauro."
ps: a minha cara ficou assim depois de escovar o bloco do DS com berbequim e escova de arame.
"Há precisamente dez anos, ali a seguir às férias de verão, tomei uma decisão que ora apelido da decisão mais absurda da minha vida, ora encaro como um dos projectos que mais prazer me tem dado ao longo destes intermináveis dez anos. E dos que ainda faltam, seguramente muito menos do que dez!
Na altura comecei por desmontar as duas portas da frente do meu DSuper de 1970 para tratar apenas uma "meia dúzia de podrezitos" nas embaladeiras mas dava mais jeito se desmontasse também os guarda lamas da frente... e assim foi.
Depois, como que num "já agora", segui para as portas de trás e mais tarde, inspeccionada cuidadosamente a tampa da mala, verifiquei que esta também não tinha escapado à acumulação de água na zona da borracha de vedação. É muito normal nestes carros.
Finalmente, como o capôt já estava fora, só faltava mesmo o tejadilho e assim fiquei a saber como fica engraçado um DS sem os painéis da carroçaria...
E que teríamos nós debaixo dos tapetes!? Estava com muito medo de os levantar mas tinha que ser... Ó meus Deus, quase não tinha chão do meu lado!!... A sorte é que a fuga de óleo do repartidor dos travões estava a retardar o avanço da corrosão. Tinha mesmo que tirar os bancos; e o depósito da gasolina; e o tablier. E tinha de desmontar as portas para as tratar por dentro; e tinha de substituir grande parte da alcatifa insonorizante que estava podre e a esfarelar.
Os trens da suspensão de trás, pintados no verde característico do circuitos de óleo LHM estavam mesmo feios. E as barras e crenques de direcção então nem falar... o motor e a zona do charriott estavam tão feios e sujos de óleo empapado com terra, que o motor tinha inevitavelmente que sair...E foi assim que cheguei ao natal de 2005 com o DS todo desmontado.
Fosse o DS um carro convencional e, mesmo no meu ritmo de entusiasta que evita dar o trabalho a terceiros, o carro já estaria a rolar há mais de cinco anos (como aliás foi acontecendo com outros projectos intercalados com o DS pelo meio destes 10 últimos anos). Mas um DS é um "projecto de vida" como eu costumo dizer aos meus amigos e familiares: neste carro nada é convencional; nada é normal; nada é igual a nada, a começar pela medida e passo dos parafusos M5, M7 e M9... para não referir o óbvio que é a suspensão hidro-pneumática.
A verdade é que a chapa revelou estar bastante pior do que eu algum dia podia ter imaginado e até que o chapeiro pusesse o chassis pronto a pintar demorou mais de dois anos. Tudo feito no meu armazém/oficina e nas horas vagas do chapeiro.
O tratamento dos componentes hidráulicos como a direcção assistida, o acumulador, os correctores de altura e repartidores, isto é, a sua desmontagem, limpeza, compra dos respectivos kits de reparação, pintura e remontagem, ficou a meu cargo e demorou o seu tempo.
Cedo decidi que o motor nunca iria voltar para o sítio nas condições em que estava e também ele foi desmontado até ao último parafuso. E ainda bem porque embora os pistões estivessem muito bons, os segmentos precisavam de ser substituídos. Aproveitei para limpar o bloco por dentro e por fora, para o pintar, para polir todos os componentes não ferrosos, pintar todos os acessórios externos como o depósito de óleo LHM, filtro de ar, bobina e uma panóplia de chapas de suporte que mais parece terem sido feitas na fase de produção do protótipo porque os engenheiros se tinham esquecido de como iam segurar aqueles componentes ao motor!
Pelo caminho fui recorrendo à ajuda de amigos especialistas onde o trabalho se mostrava mais complicado como a reparação da direcção assistida, o armar do bloco do motor e para rodar e afinar válvulas depois de revista a cabeça.
Este ano o carro foi finalmente para o chão com o motor a trabalhar e com todo o sistema hidráulico revisto e em perfeitas condições! Uma vitória e um marco no projecto. Atrevo-me a dizer que quem restaura um DS fica apto para qualquer carro (só o SM deve ser mais complicado uma vez que leva um motor italiano...)
O DS está agora preso à espera dos perfis de suporte das borrachas de vedação das portas e depois de montar os painéis e de afinar todas as folgas, vai pintar, algo que não serei eu a fazer porque quero uma pintura imaculada na sua cor de origem que é o Vert Charmille (AC522) com tejadilho Gris Nacree.
Tenho dado por mim a pensar que o que me dá o verdadeiro gozo é o meio e não o fim, ou seja, depois de um carro pronto, é verdade que o prazer de o desfrutar é grande, mas para mim nada se compara ao gozo de vencer a batalha contra um parafuso partido num furo onde aperta a bomba de água, ou de chegar ao fim da instalação eléctrica com os fios todos ligados no sítio certo.
Ao meu ritmo de trabalhador por conta de outrem, estimo que entre pintura e estofador, o meu DS fique pronto lá para o verão de 2017 mas já estou com medo que a primeira saída não me dê o prazer que me estão a dar estes dez anos de restauro."
ps: a minha cara ficou assim depois de escovar o bloco do DS com berbequim e escova de arame.
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